Com maior nível de exigência do consumidor, indústria de carnes adota novas ferramentas tecnológicas de rastreabilidade. Flávio Redi, da startup Ecotrace, aponta as tendências de mercado para essas soluções
No final do mês de maio, o combate ao desmatamento ilegal nas cadeias agropecuárias se tornou, oficialmente, um tema comum para instituições financeiras e indústria frigorífica. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) anunciou que os bancos brasileiros terão de cumprir um protocolo com registros mínimos comuns para que a oferta de crédito a frigoríficos e matadouros impulsione o fim do desmatamento ilegal. A decisão foi tomada pelo Conselho de Autorregulação da Febraban, reforçando a lista de ações no campo das finanças sustentáveis.
A partir dessas novas definições, bancos que integram a Autorregulação deverão solicitar a seus clientes com atuação na Amazônia Legal – que abrange Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e parte do Maranhão – e em todo o território maranhense, que implementem um sistema de rastreabilidade e monitoramento capaz de garantir que o fornecimento – direto e indireto – de gado esteja livre de desmatamento ilegal. Isso tem de acontecer até dezembro de 2025.
“Os bancos estão no epicentro das cadeias produtivas do País e irão estimular ações para desenvolver uma economia cada vez mais sustentável”, diz o presidente da Febraban, Isaac Sidney Menezes Ferreira. A entidade reconhece, no entanto, quão desafiador é implantar a rastreabilidade em todo o setor pecuário, sobretudo nos estágios iniciais da rede de fornecimento.
Inovação tecnológica na indústria
Essa é uma mudança que não se constrói de forma isolada. Pelo contrário, faz parte de uma transformação ainda maior e que já está em andamento na cadeia produtiva de alimentos. A cobrança parte dos consumidores, dentro e principalmente fora do País, vai promovendo um efeito cascata que chega até o produtor rural e avança sobre quem o atende.
“As mudanças de mercado sempre partem da ponta, da demanda do consumidor. E há uma pressão sobre as instituições financeiras, inclusive de investidores, relacionada a ESG (governança ambiental, social e corporativa)”, explica o CEO da startup Ecotrace Solutions, Flavio Redi. “Essa cobrança vai chegar no produtor, e quem não estiver de acordo será penalizado na hora de buscar financiamento.”
A Ecotrace Solutions vem construindo uma nova estrada tecnológica para que a indústria frigorífica dê conta de atender a demanda global por transparência e segurança das informações nessa cadeia. O grande salto que a empresa implantou foi a digitalização da rastreabilidade, aumentando a acessibilidade, e a inclusão do blockchain – tecnologia que vem do setor de criptomoedas – para assegurar a veracidade dos dados e impedir que sejam alterados. “Nós somos a startup que passou a colocar essa solução na indústria”, afirma Redi.
Mais do que implantar essa tecnologia, a Ecotrace tem desenvolvido outras aplicações de ferramentas digitais para aprimorar áreas onde ainda havia pontos sensíveis na rotina dos frigoríficos. Segundo o CEO da empresa, é um amadurecimento tecnológico.
“Em alguns processos operacionais nos quais poderia haver erros humanos, colocamos a visão computacional e ensinamos o algoritmo a executar aquela tarefa”, diz Redi. “Dessa forma, não há interpretações ou suposições, é uma informação mais precisa. E ainda complementamos o processo com inteligência artificial e inteligência das coisas.”
Outro diferencial do atendimento prestado pela Ecotrace é garantir informações relacionadas ao bem-estar animal, dados que são exigidos em protocolos de compra de alguns importadores. Neste caso, a tecnologia trabalha com averiguação sobre imagens das carcaças dentro da indústria. Por conta dessa amplitude de cobertura da cadeia produtiva de carne bovina é que a startup já responde por 40% da rastreabilidade de toda a exportação brasileira dessa commodity.
Parcerias e investimentos
No caso da produção de carne bovina, a Ecotrace Solutions presta serviços diretamente à indústria frigorífica, garantindo a precisão e a segurança das informações dali até o consumidor final. Mas há também uma imensidão de controles e procedimentos que devem ser analisados na trajetória de cada animal até chegar à linha de abate. É aí que entra a relevância do trabalho realizado pela Produzindo Certo.
“Somos empresas complementares. A Produzindo Certo faz todo o trabalho em uma ponta e a gente leva as informações até a outra”, comenta Flavio Redi. “A Ecotrace atua como um cartório digital do setor, protegendo a informação.”
Segundo o empresário, a qualidade e o compliance ambiental são garantidos por certificação – e o que a Produzindo Certo faz é garantir que as propriedades estejam preparadas para serem certificadas.
Para Redi, que acompanha essa questão da rastreabilidade na pecuária de corte há muito tempo, é uma satisfação testemunhar os avanços já alcançados até o momento. E ver que ainda há um campo vasto a ser aproveitado, pois o tema está mais na pauta do que nunca. “Por sermos uma agropecuária tropical, vamos cada vez mais produzir alimentos para o mundo. Mas para fornecermos teremos de apresentar rastreabilidade”, analisa.
A Ecotrace atua também nos segmentos de carne de frango e algodão e vislumbra entrar em vários outros. “Temos demanda para laranja, cacau, óleo de palma e café”, conta o empresário. “Estamos realizando estudos para definir prioridades, para saber em qual setor avançaremos.”
Esses novos passos também dependem de mais investimentos. A startup já havia captado R$ 8 milhões em três rodadas, e para este mês há uma nova busca de recursos, agora com o objetivo de captar R$ 3 milhões. “Como startup, estamos o tempo todo em busca de dinheiro”, comenta Redi, que também visa à expansão em outros países. A empresa já atua nos Estados Unidos e tem negociações com Paraguai, já bem avançadas, e Argentina.
O empresário contou um pouco de sua trajetória ao público da Produzindo Certo quando participou da sétima edição do Vozes Responsáveis. O tema do encontro foi exatamente o impacto do conceito de SustainableTech na evolução do agronegócio. O bate-papo está disponível na íntegra pelo canal da Produzindo Certo no YouTube.