Fundada em 2006, a Associação Internacional de Soja Responsável (RTRS) se tornou uma referência global no que diz respeito à certificação da produção do grão sob o prisma das boas práticas socioambientais. No ano passado, quando completou a primeira década desse processo, a instituição registrou a marca de 6,8 milhões de toneladas de soja certificada no mundo. E o Brasil responde por 80% desse volume, credencial mais do que suficiente para que acontecesse aqui um importante debate sobre o futuro da produção de soja responsável.
Levando-se em conta que um dos principais objetivos da RTRS é promover o crescimento da produção, do comércio e do uso de soja responsável, é essencial contar com a participação e a cooperação entre os atores ligados à cadeia de valor da oleaginosa, desde a produção até o consumo. Exemplo prático dessa conexão aconteceu no início de outubro, com uma etapa de debates e outra de visita técnica.
O evento “Ponto de Encontro RTRS 2023”, que reuniu representantes de Holanda, Suíça, Bélgica, Argentina, Paraguai, Reino Unido, Japão, França, Alemanha e Brasil, começou pela cidade de São Paulo (SP), com parte da programação da Victam Latam, exposição internacional de tecnologia, equipamentos, ingredientes e aditivos para a cadeia produtiva com foco nas indústrias de nutrição animal e de processamento de grãos. Foi a primeira vez que o evento aconteceu no Brasil. As conexões da cadeia agroindustrial da soja já começaram por aí.
Na segunda etapa desse encontro, os participantes caminharam porteira adentro em duas propriedades de Minas Gerais, na região do Triângulo Mineiro – a Fazenda Água Santa, que abrange os municípios de Perdizes e Santa Juliana, e a Fazenda São José, localizada em Araguari. A escolha ajudou a deixar claro como o processo de certificação se aplica a diferentes perfis. Enquanto na Água Santa foram cultivados 34 mil hectares de soja na safra 2021/22, na São José a área de produção soma 325 hectares. Além da opção pela produção de soja sustentável, ambas têm em comum o fato de fazerem parte da plataforma da Produzindo Certo.
Em Araguari, o grupo ainda visitou a planta industrial da CJ Selecta. A unidade do Triângulo Mineiro esmaga 2.200 toneladas de soja por dia, processando e produzindo óleo, casca, lecitina e concentrado proteico de soja.
Via de mão dupla
Diz o ditado que bom negócio é aquele em que todo mundo ganha. É exatamente esse o caminho que muita gente está buscando no mercado da soja responsável. Charton Locks, COO da Produzindo Certo, acompanhou toda a programação do Ponto de Encontro da RTRS e mediou o painel “Rotas para um amanhã sustentável – caminhos e parcerias”.
Preocupação permanente durante o debate foi a busca pela sustentabilidade também nas negociações. “É constante a cobrança por uma contrapartida, por uma valorização pelo esforço socioambiental dos produtores”, afirmou Locks. Segundo o executivo, a discussão sobre a expansão da soja sustentável está diretamente ligada ao engajamento de todos os elos na criação de um sistema de valorização real dessa cadeia.
Para Marina Born de Engels, sócia da empresa argentina Caldense S.A., uma das participantes do painel mediado por Locks, é fundamental os produtores serem sustentáveis. “Ou estaremos hipotecando nosso futuro”, disse a empresária. Mas para isso, acrescentou, “é preciso ter parcerias no modelo ganha/ganha, e a RTRS mostrou que há recompensa pela sustentabilidade”.
A necessidade de mais valorização das práticas sustentáveis foi endossada também por Pamela Moreira, gerente de Sustentabilidade para América do Sul da Bunge. “Até para que possa crescer em escala”, disse a executiva, que ainda citou a importância da conexão entre as cadeias produtivas e o mercado. “É preciso buscar quais são as demandas para essa produção certificada.”
A Produzindo Certo tem se empenhado em garimpar essas oportunidades e estabelecer as melhores conexões. Tanto que, ao longo deste ano, Locks esteve algumas vezes na Europa apresentando a investidores como se dá a produção sustentável de soja, e de outras commodities, no Brasil.
Boa impressão
Se levar a informação sobre a produção de soja responsável até os europeus já tem um efeito positivo para a cadeia como um todo, eles virem até o Brasil conhecer essa realidade reforça muito mais essa boa impressão. E, claro, para representantes de quaisquer continentes.
Para Cristhiane Simioli, gerente de Projetos da Produzindo Certo, é muito importante que os estrangeiros possam conhecer o Brasil da porteira para dentro. “Há dificuldades, desafios e oportunidades, e o ideal está longe do real que temos”, disse. “É essencial que conheçam essa realidade para que possamos aprimorar, crescer e ganhar escala.”
Também ficou mais claro para os visitantes qual é a dimensão da certificação dentro das fazendas, o impacto causado por todo o processo para que a propriedade esteja habilitada para receber tal reconhecimento.
“Foi demonstrado que é possível assegurar que itens processados de soja foram produzidos em condições ambientalmente corretas, socialmente justas e economicamente viáveis com desmatamento zero”, afirmou Patricia Sugui, gerente de ESG da CJ Selecta.
Foi essa a imagem captada por Henk Flipsen, importador de soja da empresa holandesa Nevedi. “É muito importante ter a certificação para provar que a soja que está sendo comprada é produzida de maneira responsável”, disse.
A mesma impressão teve Eddy Esselink, representante da associação holandesa Product Board for Margarine, Fats and Oils. “Achamos crucial mostrar às pessoas, em especial na Europa, o que está realmente acontecendo e quais esforços estão sendo feitos para preservar a natureza no Brasil”, comentou.
Lieven Callewaert, presidente da RTRS, reforçou a importância de ser um processo coletivo e colaborativo, somando os valores de cada elo da cadeia para fortalecer a produção de soja responsável. “Após essa viagem, acredito que estamos fazendo a coisa certa e do jeito correto. Mesmo diante de algumas incertezas, como a nova legislação europeia de zero desmatamento que entrará em vigor no final do próximo ano”, afirmou o executivo.
Certamente ainda há muito para avançar nesse campo, sobretudo no processo de concretizar as oportunidades. De 2021 para 2022, o volume de soja com certificação RTRS no Brasil saltou de 3,6 milhões para 5,5 milhões de toneladas. Quanto mais o mundo conhecer a realidade brasileira da soja responsável, maior será a possibilidade de transformar tudo isso em novos negócios. A Produzindo Certo estará sempre pronta para dar sua contribuição.