Com menor oferta do produto no mercado internacional, em virtude do conflito entre Rússia e Ucrânia, é preciso estar atento e buscar alternativas
O Brasil compra de outras nações 85% dos fertilizantes aplicados hoje nas lavouras do País. Desse total, cerca de 25% são fornecidos pela Rússia. Esse é um dos fatores que causam grande preocupação e incertezas ao agronegócio nacional no momento em que acompanhamos a escalada dos ataques russos contra a Ucrânia, uma das regiões agrícolas mais férteis do planeta.
A perspectiva de interrupção do fornecimento de fertilizantes por conta do conflito ajudou a acelerar a divulgação do Plano Nacional de Fertilizantes. A estratégia para diminuir a dependência brasileira das importações do insumo até 2050 acaba de ser apresentada pelo Governo Federal. Além de aumentar a produção nacional, o plano ainda destaca oportunidades em relação a produtos emergentes, como os fertilizantes organominerais e orgânicos.
A conjuntura atual exige, no entanto, que o Brasil tenha alternativas capazes de gerar resultados no curto prazo. Por isso, listamos seis pontos para ajudar você a entender as principais questões que estão em jogo e com que armas o produtor rural pode se defender diante da possibilidade real de encurtamento da oferta mundial de fertilizantes e de preços ainda mais altos na próxima safra.
1 – O Brasil tem como substituir os fertilizantes importados da Rússia e de Belarus?
Em 2021, a Rússia foi o principal fornecedor de adubos para o agro nacional. Mais de 20% do insumo veio daquele país. Junto com Belarus, responde por cerca de 30% de todo fertilizante importado pelo Brasil.
Diante dessa grande dependência dos insumos russos, o governo brasileiro busca ampliar as compras de outros países, como o Irã. Em fevereiro, a Ministra da Agricultura, Tereza Cristina, esteve naquele país a negócios. Na viagem ficou mais do que claro o interesse do Brasil em aumentar as exportações de commodities agrícolas ao país do Oriente Médio em troca de fertilizantes. O Irã já é um importante fornecedor de ureia.
Recentemente, a Ministra também se reuniu com embaixadores de países árabes, que manifestaram a disposição de aumentar as vendas de adubo para o Brasil.
Outra nação que está na mira do Ministério da Agricultura como alternativa para a compra de adubos é o Canadá. Em viagem prevista para esta semana, Tereza Cristina negociaria principalmente a compra de potássio, matéria prima cuja importação chega a mais de 90% da demanda interna e que tem o Canadá como maior produtor mundial.
Apesar de haver alternativas em torno de fornecedores, a disputa pelo produto deve aumentar – e com ela, os preços praticados no mercado internacional.
2 – O Brasil tem reservas de minerais usados como fertilizantes suficientes para ser autossuficiente?
O consumo anual de fertilizantes no Brasil fica em torno de 40 milhões de toneladas. Segundo o sindicato das indústrias do insumo, o Sinprifert, as 22 plantas instaladas no país têm capacidade para fabricar 14 milhões de toneladas, mas só produzem atualmente cerca de 6,4 milhões por conta de alguns desafios, como preço da matéria-prima e morosidade regulatória.
O Brasil é o quarto maior consumidor de fertilizantes do mundo. Atrás dos Estados Unidos, da Índia e da China, consome em torno de 9% de todo produto no mundo. No entanto, é o único dessa lista que precisa importar mais de 80% de tudo que consome.
Essa dependência é um dos grandes gargalos do setor produtivo no País. O Plano Nacional de Fertilizantes, lançado agora em março, não projeta a autossuficiência, mas tem uma meta bastante desafiadora: diminuir a dependência de importações dos atuais 85% para 45% até 2050.
Segundo dados da Agência Nacional de Mineração (ANM), o potencial de reservas para fertilizantes, como o potássio, é de 1,1 bilhão de toneladas por ano até 2089. As maiores reservas estão em Minas Gerais, São Paulo e Sergipe.
3 – A próxima safra pode sofrer perdas em função da escassez de fertilizantes?
Como a maioria dos produtores brasileiros compra o insumo de forma antecipada, a previsão é que, ao menos até o início do plantio, a safra 2022/2023 esteja garantida.
“A safrinha de milho já está acontecendo, então o que precisava de fertilizantes já está garantido. A safra de verão, que será no final de setembro, outubro, é uma preocupação, mas também temos do setor privado a confirmação de que há um estoque de passagem suficiente para chegar até outubro”, disse a ministra em entrevista coletiva no início de março.
A partir de setembro/outubro a conjuntura atual aponta para uma tendência de menor oferta e preços ainda mais elevados para os fertilizantes, o que pode colocar em risco a produção agrícola brasileira.
4 – É possível economizar fertilizantes?
Diante das incertezas que atingem o mercado global de fertilizantes, a melhor alternativa para os produtores que têm a intenção de economizar o insumo é fazer um manejo eficiente do solo, com análise do terreno e aplicação baseada nas reais necessidades de cada área.
Para ajudar o produtor a adotar práticas mais eficientes no campo, o governo lançou a Caravana FertBrasil, iniciativa que será conduzida pela Embrapa a partir de abril.
Com visitas técnicas às regiões produtoras, o objetivo é tratar da eficiência no uso de fertilizantes no campo tendo em vista já o próximo ciclo produtivo. A previsão é de que seja possível gerar uma economia de até 20%, o equivalente a R$ 1 bilhão.
Técnicos serão enviados para 30 polos agrícolas do País para levar conhecimento sobre a correta avaliação do solo e a dosagem necessária de adubos.
5 – Quais as principais alternativas para o produtor substituir os fertilizantes químicos nas suas lavouras?
A adoção de um sistema de produção mais responsável, com o uso de bioinsumos por exemplo, pode ajudar os produtores brasileiros a terem mais autonomia diante de momentos de crise como o que estamos vivendo.
O Brasil já tem tecnologia para o uso de insumos biológicos. O próprio Plano Nacional de Fertilizantes vai incentivar e explorar as oportunidades em relação a produtos emergentes como os fertilizantes organominerais (adubos orgânicos enriquecidos com minerais, por exemplo), os subprodutos com potencial de uso agrícola, os bioinsumos, biomoléculas, os remineralizadores (pó de rocha, por exemplo), nanomateriais, entre outros.
“A agricultura brasileira é forte, vai continuar forte, e temos que dar as alternativas para ela continuar trabalhando”, defende a Ministra Tereza Cristina.
6 – A alta dos preços das commodities agrícolas em função da guerra entre Rússia e Ucrânia beneficia o produtor brasileiro?
Como um dos maiores produtores mundiais de grãos, o Brasil se beneficia do ciclo de alta nos preços das commodities agrícolas e pode atrair investimentos que antes estavam voltados para as áreas envolvidas no conflito. Por outro lado, a guerra também traz sérios problemas para os nossos produtores.
“De certa forma o produtor brasileiro se beneficia por um lado, mas perde em outros. A forte alta dos preços do trigo e do milho, uma das consequências da guerra, beneficia o agricultor brasileiro. Mas de outro lado a guerra está encarecendo o preço dos fertilizantes e também os combustíveis. E isso encarece o custo de produção agrícola aqui dentro. E tudo isto impacta na inflação e no bolso de todos nós, consumidores.”, explica o jornalista e analista de mercado agrícola Silmar Cesar Muller.