Elas lideram 19% das propriedades rurais brasileiras, segundo o IBGE, e estão cada vez mais presentes em funções ligadas à produção responsável
Seja no comando das fazendas, de instituições de classe do setor, nas universidades e centros de pesquisa ou à frente de grandes empresas, as mulheres têm conquistado cada vez mais espaço e posição de liderança no agronegócio. De acordo com o último Censo Agropecuário do IBGE, 18,6% das propriedades rurais do Brasil são lideradas por elas. Esse número cresce ainda mais e passa a 35% quando somadas as profissionais que administram as fazendas junto às famílias. Ainda segundo o Censo, são quase 1 milhão de mulheres na direção das fazendas brasileiras.
Além do aumento na participação diretamente na liderança, elas também aparecem de forma expressiva na direção compartilhada entre casais. Mais de 1 milhão de propriedades, ou 20% dos estabelecimentos, têm a direção compartilhada. São mais de 800 mil mulheres que dividem essa responsabilidade com o cônjuge.
“É muito inspirador ver tantas mulheres liderando transformações no agro, um setor em que expressamos a nossa vocação de cuidar, pois tudo que envolve plantar, colher, criar e preservar, requer cuidado. Aqui temos mulheres em campo, no escritório e muitas produtoras na nossa plataforma”, diz Aline Locks, CEO da Produzindo Certo.
Também nas empresas de diversos segmentos ligados ao agronegócio, a presença feminina é quase majoritária na gestão das áreas responsáveis pelas políticas e ações de sustentabilidade. Há poucas pesquisas relacionando mulheres à produção responsável, mas pelo menos uma delas, realizada pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA) na cadeia da soja na região do Matopiba, mostra que elas dão mais ênfase às boas práticas socioambientais quando estão no comando dos negócios.
Participação x Remuneração
Diferente da maioria das mulheres que ingressam no setor, Aline não vem de uma família do agronegócio, mas nasceu e estudou em um dos estados que mais contribuem para a agropecuária nacional, o Mato Grosso do Sul.
“Logo depois de me formar em Engenharia Ambiental pela UFMS, comecei a trabalhar na ONG Aliança da Terra, com a missão de conectar produção rural e conservação ambiental e então já semeava o que hoje é a Produzindo Certo. De cara eu me apaixonei pelo campo, pois é de lá que sai quase tudo o que comemos, o que vestimos e o que utilizamos como energia”, destaca.
A pesquisa do Cepea, que avaliou o crescimento da participação feminina no agronegócio, constatou que entre 2004 e 2015, enquanto o número de homens que atuam no setor caiu quase 12%, o total de mulheres cresceu 8,3%. Índice que mostra um aumento consistente da participação delas no mercado de trabalho do agro.
O estudo mostrou ainda que, enquanto os homens atuam predominantemente na agropecuária, as mulheres ocupam cargos principalmente nas agroindústrias e nos agrosserviços.
Outro levantamento, feito em 2018 pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), evidenciou, porém, que a participação das mulheres no agronegócio ainda é menor do que na média da economia brasileira. No entanto, o diferencial de remuneração entre elas e eles é menor no setor produtivo. Em especial na pecuária, atividade em que a remuneração feminina representou, na média, 99% da recebida pelos homens em 2017.
Além disso, é importante destacar que a remuneração das mulheres tem crescido em um ritmo mais intenso do que a dos homens desde 2012. Esse crescimento é observado em toda economia, mas no universo agro é ainda mais forte.
Há espaço para crescer muito mais
Apesar dos números atuais serem positivos, ainda há muitos desafios. De cada 10 cargos de gestão do agronegócio brasileiro, menos de 2 são ocupados por mulheres. Em áreas da agropecuária, elas são responsáveis por liderar a produção de 30 milhões de hectares, o que representa apenas 8,5% do total ocupado por sítios e fazendas no país.
“Vemos muitos movimentos femininos se formando em torno do agronegócio, creio que a participação feminina ainda será crescente nos próximos anos, tanto de mulheres porteira adentro, como posicionadas em empresas, instituições financeiras e multinacionais que atuam no agro”, diz Aline.
Um dos caminhos possíveis para o crescimento ainda maior das mulheres dentro do agro é a busca pela produção responsável, alinhada às questões socioambientais. A pesquisa “Mulher e sustentabilidade no sistema agroindustrial da soja”, divulgada recentemente pelo Cepea, por exemplo, mostrou, entre outros aspectos, que as mulheres percebem que a sustentabilidade gera valor monetário, tanto no curto, quanto no longo prazo.
Além disso, 67% das mulheres ouvidas no estudo também entendem que a sua inserção no setor pode contribuir para o avanço do tema, tanto pelo maior envolvimento com questões coletivas e de longo prazo, quanto pela maior habilidade em discutir e defender o assunto.
Várias organizações e movimentos de mulheres discutem e defendem cada vez mais a inovação, a necessidade de melhoria na imagem do setor e o desenvolvimento de sistemas de produção mais sustentáveis para atender não só os desafios atuais, mas principalmente semear um futuro melhor para as próximas gerações.
“Uma vez eu li em um livro uma definição sobre riqueza que dizia assim: ‘Riqueza é a maior transformação que conseguimos fazer em um ambiente de forma que tudo que é vivo – e é importante para o que é vivo – exista sem escassez.’ Na mesma hora fiz a correlação com a agricultura sustentável. Produzimos alimento, fibra e energia, e ao mesmo tempo podemos cuidar da floresta, da água, do ar e do solo”, finaliza a CEO da Produzindo Certo.
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