O desafio da implementação das metas de descarbonização vai colocar muitas empresas sob pressão. E elas vão precisar de ajuda para sair dessa enrascada
Um levantamento global feito pelo Institute for Business Value (IBV), ligado à multinacional americana IBM, e publicado no ano passado aponta que cerca de 90% das empresas entrevistadas declararam ter compromisso com a implementação de soluções ESG – ambientais, sociais e de governança. A notícia é ótima, mas um outro dado da mesma pesquisa aponta que entre o desejo e a sua concretização existe um nó a ser desatado.
Dos 1.900 executivos ouvidos pelo estudo (a maior parte deles de empresas de varejo e bens de consumo, inclusive da América Latina), menos de um terço têm metas definidas que lhes permitam mensurar e implementar esses compromissos.
Fenômeno semelhante foi identificado pelo Carbon Disclosure Project (CDP), em um recorte das empresas brasileiras de capital aberto. A organização internacional que é uma das referências no mapeamento de emissões de gases de efeito estufa (GEE) identificou um aumento de 42% no número de companhias que reportaram ao questionário de clima do CDP Latin America no ciclo de 2021, quando comparado ao de 2020. Isso demonstra maior interesse e comprometimento em dar transparência à suas ações de redução de gases.
Ao mesmo tempo, o CDP informa que até 2021 foram reduzidas aproximadamente 190 milhões de toneladas de GEE. Trata-se menos de 1% do total apontado pelo laboratório Cenergia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como necessário para que o setor de Agricultura, Florestas e Uso do solo (AFLOLU) compense, até 2050, 79,5% dos GEE emitidos e atinja um cenário de neutralidade climática, “o que tornaria o principal setor responsável por compensar os gases emitidos por outras atividades econômicas no país”, segundo afirmam, em um artigo na revista Exame, Miriam Garcia, gerente de Políticas Públicas, e Antonio Ouro, assistente de Políticas Públicas do CDP.
A cada dia que passa, metas e compromissos que pareciam distantes começam a aparecer no horizonte. Ninguém se torna carbono zero ou Net Zero da noite para o dia. E, principalmente, nenhuma empresa ou país atingirá esse estágio sem planejamento, recursos e gente capacitada para conduzi-la nesse caminho.
Com o calendário em constante movimento, quem assumiu compromissos já deve estar sentindo na pele os desafios de implementá-los. A começar pela mensuração das emissões e dos impactos das ações de descarbonização. O agronegócio brasileiro, como indicam os executivos do CDP, é visto como potencial protagonista em oportunidades para projetos de sequestro de carbono. Apenas o plano ABC+, de incentivo à agropecuária de baixo carbono, prevê retirar mais de 1,1 bilhão de toneladas de CO2 equivalente até 2030.
A pergunta que fica é: quem vai fazer esse serviço limpo? Executar projetos de descarbonização no campo exige conhecimento de campo, capacidade de engajamento de produtores rurais, qualificação para execução de diagnósticos socioambientais e implementação de boas práticas e de sistemas de produção como ILPF e agricultura regenerativa, por exemplo.
O primeiro fator nesse sentido é a formação de profissionais qualificados para avaliar uma propriedade rural a partir da ótica sustentável e com o olhar nas exigências das principais certificações internacionais. Nos próximos anos, agrônomos, veterinários e extensionistas com conhecimentos específicos da aplicação de protocolos para crédito de carbono ou certificações de produção responsável serão cada vez mais demandados e valorizados.
Quando se amplia o olhar para toda a cadeia, no caso dos compromissos Net Zero, o desafio é ainda maior. Segundo um levantamento feito em parceria pela The Energy & Climate Intelligence Unit (ECIU), organização britânica voltada para a discussão das mudanças climáticas, e a Oxford Net Zero, uma iniciativa multidisciplinar coordenada pela Universidade de Oxford, anúncios de nações e empresas para atingir emissões líquidas zero impactam 68% do PIB (em comparação a apenas 16% em 2019), 56% da população e 61% das emissões globais.
Ou seja, se realmente executados, gerariam benefícios em escala planetária. A questão, apontada pelos pesquisadores, é de que não há clareza sobre como essas metas serão atingidas. Muitas vezes, nem mesmo quem prometeu alcançá-las sabe.
No estudo do IBV as empresas entrevistadas afirmaram que uma das maiores dificuldades em estabelecer metas de sustentabilidade vem do fato de não terem controle sobre as atividades de seus parceiros. No caso das empresas de varejo, segundo a pesquisa, cerca de 80% das emissões relacionadas à produção dos bens por elas comercializados estariam concentradas em atividades desses fornecedores.
Assim, a implementação de programas ambiciosos de descarbonização exigirá cada vez mais de auxílio de especialistas em acompanhar e verificar cada elo da cadeia. Surge, assim, um novo ator relevante nesse processo: o parceiro implementador. No agro, empresas como a Produzindo Certo já atuam nesse segmento, aproximando empresas preocupadas em garantir uma cadeia de fornecimento verificada de produtores que buscam melhorar o desempenho socioambiental de suas propriedades. E também na formação dos profissionais que ajudarão empresas e produtores nessa transição. Não é um trabalho trivial, mas é crucial para o futuro do setor.