Mais do que alimentos, fibras e energia, agronegócio oferece amplo espaço para o cultivo de aplicações financeiras e oportunidades para uma colheita farta de rendimentos
Recentes notícias sobre tremores globais no sistema financeiro dispararam uma série de questionamentos. Primeiro foi a falência do Silicon Valley Bank (SVB) nos Estados Unidos, seguida do fechamento de outro banco, o Signature Bank, de Nova York. No caso do SVB, trata-se de uma instituição financeira com 40 anos de existência, e cuja principal linha de atuação estava nas empresas de tecnologia, startups, um segmento pulsante e crescente. As comparações com a crise financeira norte-americana de 2008 foram inevitáveis. Aliás, a quebra do SVB é considerada a maior falência de uma instituição desde então.
Nesta semana, as atenções ficaram na Suíça, onde o tradicional banco Credit Suisse foi adquirido pelo também suíço UBS, numa operação de salvamento coordenada pelas autoridades financeiras locais.
Tal situação joga luz sobre os riscos e as fragilidades do setor financeiro e da economia em geral. E, neste momento, deixa mais claro o cenário global de inflação alta e juros elevados, o que encarece o custo de oportunidade no campo de investimentos. É exatamente nesse ponto, em que a economia global sinaliza uma potencial recessão, que o agro fica ainda mais negócio. Na verdade, o setor já vem conquistando essa notoriedade há algum tempo, não só pela sua relevância na economia brasileira, mas também pela sua resiliência em momentos de crise, representando uma boa alternativa para a diversificação de riscos em uma carteira de investimentos.
Segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), em 2022, as emissões de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) somaram R$ 40,8 bilhões. Esse valor é 62,4% maior do que o registrado no ano anterior (R$ 25,1 bilhões). E o montante de 2021 já representou crescimento de 65,1% sobre 2020.
Boa parte desse avanço está relacionada às características do investimento. Como descreve a B3, os CRAs são “títulos de renda fixa lastreados em recebíveis originados de negócios entre produtores rurais, ou suas cooperativas, e terceiros, abrangendo financiamentos ou empréstimos relacionados à produção, à comercialização, ao beneficiamento ou à industrialização de produtos, insumos agropecuários ou máquinas e implementos utilizados na produção agropecuária”. “A estrutura de um CRA é bem customizável e o arcabouço de garantias, além do lastro do recebível oriundo da comercialização da produção, pode contemplar também garantias reais e seguros, a depender do prazo da operação e condições”. explica Thiago Brasil, CFO da Produzindo Certo.
Conexão direta com a Faria Lima
Um dos principais pilares da economia brasileira, o agronegócio demanda uma grande captação de recursos financeiros para crescer em produtividade, qualidade e sustentabilidade. Ainda mais porque os resultados das principais atividades agropecuárias são periódicos, colhidos a cada safra. E porque os recursos do Plano Safra, por mais relevantes que sejam, não dão conta da real necessidade do setor. Aí entra a captação junto ao mercado de capitais.
Mais uma referência do sucesso desta aproximação do meio rural com os grandes centros urbanos de investimento, como a Av. Faria Lima, na capital paulista, está nos resultados das captações dos Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais, o Fiagro. De agosto de 2021, quando começaram as operações, até dezembro do ano passado, houve captação de R$ 7,1 bilhões, de acordo com a Anbima.
Outro ponto positivo desse processo foi o lançamento dos primeiros Fiagros verdes, que trazem em seu escopo compromissos socioambientais e critérios sustentáveis passíveis de checagem e comprovação. O primeiro deles foi certificado em outubro do ano passado.
Dar mais transparência aos critérios que estão sendo analisados é essencial pois permite ao investidor entender o real engajamento com a sustentabilidade, e o nível de comprometimento, principalmente financeiro, com as transformações nos meios produtivos. Com a pauta ESG em destaque é importante separar o joio do trigo, pois nem todas as operações possuem contrapartidas elevadas em termos de investimentos, não desmatamento, que realmente justifiquem algum benefício em termos de redução de taxa, ou melhoria nas condições, por ser “Verde”. Além disso, critérios objetivos de verificação são fundamentais pois permitem evitar o greenwashing.
Um dado que chama atenção sobre os Fiagros é o fato de mais de 90% dos investimentos no produto em janeiro deste ano terem sido feitos por pessoas físicas. No total, as operações somaram R$ 1,1 bilhão, o maior volume mensal desde o lançamento do fundo. “Quando se pensa em uma diversificação da carteira de investimento, faz todo o sentido aparecer o agronegócio como opção, pois é um setor que sobressai em termos de resiliência e segurança e apresenta uma proteção natural contra a inflação”, comenta Thiago Brasil.
E essa relação pode crescer muito, segundo o CFO da Produzindo Certo. “Comparado a outros países, o mercado de capitais brasileiro ainda é muito jovem. Como o custo de algumas emissões é alto, ainda são poucas as empresas que buscam essa opção para se financiar”, diz ele. De acordo com o executivo, esse quadro acaba reduzindo as opções e reflete na forma como as pessoas veem o mercado financeiro. “Mas a situação vem mudando, há um processo de redução nos custos, aproximação dos investidores e de maior conhecimento do setor”, acrescenta Thiago.
Sem milagres
A informação e o conhecimento são dois dos principais insumos para que essa conexão seja cada vez ampla e mais sólida. Essa máxima serve para todos os perfis de investidores, desde os mais conservadores, avessos a riscos, até os mais arrojados, que vivem do risco. Segundo o CFO da Produzindo Certo, quem está se preparando para entrar no mercado de capitais, seja qual for o objetivo, precisa, antes de qualquer coisa, entender qual é seu perfil de investidor, se tem disposição e condições, principalmente financeiras, para correr mais riscos ou se é alguém que prefere ficar longe dos riscos.
O executivo também destaca a importância de entender bem as razões pelas quais está buscando opções para investir e suas necessidades. “No caso da pessoa física, por exemplo, é essencial saber por quanto tempo consegue manter o capital investido sem mexer, se necessita de liquidez mais breve, com retiradas mensais, semestrais ou anuais”, orienta.
Também é primordial entender como são as estruturas de garantia, o que pode acontecer nas mais diversas e piores situações, se o investimento é em uma dívida, com preferência no recebimento e garantias reais, por exemplo, ou em ações que constituem a participação em uma empresa. E para ter esse conhecimento é preciso dedicação, estudar o mínimo para não investir às cegas. Seja como for, é vital compreender que não há milagres, e que ambição e ganância são coisas distintas. “É essencial diferenciar investimento de especulação. Quando alguém oferece rendimentos mirabolantes, em curto espaço de tempo e com pouco risco, isso é especulação”, alerta Thiago.