Adotar práticas que ofereçam melhores condições de vida para o rebanho é uma exigência cada vez maior do mercado. Saiba quais os pontos básicos que merecem sua atenção
No grande cardápio das boas práticas produtivas, vez por outra um capítulo ganha mais destaque, seja por conta das demandas do mercado, seja por se mostrarem relevantes no resultado dos produtores rurais. Para os pecuaristas, por exemplo, o tema da vez é o bem-estar animal. Uma exigência cada vez mais frequente dos consumidores de produtos de origem animal, a comprovação de que o manejo é feito de forma a causar menos estresse e gerar mais conforto aos rebanhos tem mobilizado um número crescente de empresas e criadores, tornando-se um diferencial necessário para quem deseja acessar mercados mais maduros.
“A implementação de práticas de bem-estar animal pode sim se refletir nas contas do produtor”, afirma o engenheiro agrônomo Matheus Witzler, gerente de certificação da SBC, empresa com cerca de 20 anos de atuação na certificação da produção agropecuária. “Com o manejo adequado, o gado tem rendimento melhor, menos contusões, não tem desclassificação de carcaça na hora da venda. Além disso, há menos acidentes com trabalhadores nas fazendas”.
Considera-se que um animal está em estado de bem-estar quando ele é mantido saudável, bem alimentado, seguro e livre de estresse por medo, dor ou angústia. Assim, o objetivo de um pecuarista que deseja implementar um modelo de bem-estar animal (BEA) em sua propriedade deve criar condições para que o rebanho tenha um comportamento mais próximo possível do que seria natural para sua espécie.
Nos últimos anos, com a preocupação maior sobre o tema, uma série de técnicas foram desenvolvidas nesse sentido. Segundo Witzler, para começar a aplicá-las nem sempre é necessário um investimento muito grande. “O fator mais importante é o conhecimento, investir nas pessoas”, explica ele, que tem atuado na auditoria e em certificações de BEA em fazendas em todo o país.
Protocolos de certificação BEA podem incluir, de acordo com o especialista, a verificação de 50 a 150 diferentes critérios, englobando questões trabalhistas, de capacitação de pessoas, estrutura física, água, entre outras. “A certificação BEA deixa o produtor pronto para mercados exigentes”, afirma. “Mas a certificação deve ser o fim, não o princípio de um trabalho”.
Acompanhe a seguir, algumas orientações do especialista para o pecuarista que quer dar os primeiros passos nessa área:
Qualificação da equipe:
“O primeiro passo para quem busca uma implementação de práticas de bem-estar animal é a qualificação da equipe que vai manejar os animais. É o peão ou o vaqueiro quem precisa tomar decisões no momento em que as coisas saem do roteiro desejado. Para que tome a decisão certa ele precisa ter capacitação. Esse é o ponto central do bem-estar animal”.
“No manejo de um rebanho, há vários momentos que fogem à regra, pois um animal vivo nem sempre se comporta como planejado. Isso pode acontecer quando ele tem dificuldade de entrar em curral, passar por uma porteira, ou em um estouro de boiada. Isso costuma gerar, no trabalhador, um ímpeto de forçar o animal a fazer o que ele quer. Não é o que deve acontecer. É preciso treinamento para que ele trabalhe com técnica, não com o ímpeto”.
Estrutura da fazenda:
“Também não adianta ter equipe treinada se não houver estrutura adequada para o trabalho, que não estresse e machuque o animal e também o funcionário da fazenda”.
“É preciso dar condições para que o peão seja capaz de aplicar as técnicas aprendidas. Não precisam ser investimentos caros, mas bem feitos. O curral, por exemplo, não precisa ser ultramoderno, tem de ser bem construído”.
“Deve-se eliminar pontas que possam machucar animais e pessoas. Em alguns pontos, a estrutura precisa ser bem vedada para não entrar luz que possa assustar o animal”
“Bretes barulhentos e que exigem muita força para serem fechados também podem gerar estresse, tanto para o animal quanto para seu tratador. O mesmo vale para porteiras caindo, que o peão sofre para fechar”.
“Os pisos das áreas de manejo devem ser adequados, para que o animal não escorregue. É importante que o embarcador, por exemplo, ofereça segurança ao animal quando ele pisar”.
“Currais com estruturas anti-estresse são um avanço importante, mas precisam ter manutenção adequada. Não adianta fazer um grande investimento em um ponto, mas não cuidar do todo.”
Nutrição e saúde:
“Manter os animais bem alimentados e saudáveis é extremamente importante. Boa parte das fazendas já atendem esse quesito com mais facilidade. Elas mantêm plano nutricional e acompanhamento veterinário, pois sabem que isso implica diretamente em ganho de peso do animal. Por isso, não vejo esse fator como crítico”.
“Ainda assim, é preciso estar atento aos detalhes. Não adianta ter o bebedouro se a água está suja. O pecuarista precisa saber quando é feita troca água e a limpeza.”
Confinamento X pasto:
“Modelos produtivos diferentes exigem preocupações diferentes. No confinamento, deve haver uma preocupação maior com uma eventual falta de água e alimentos, já que os animais dependem 100% do que lhes é ofertado. No pasto, além da ração, o gado ainda tem a opção da pastagem.”
“O contato com as equipes é mais intenso para o gado confinado. As condições são naturalmente mais estressantes, exigem um cuidado maior. Também há uma maior preocupação com as estruturas físicas, inclusive as condições do solo, que podem acarretar em doenças para o rebanho”.
“Nas áreas de pastagem, o animal está mais próximo de sua condição natural. A preocupação com as estruturas é menor, mas é preciso acompanhar a qualidade do pasto e a oferta e qualidade da água”.
Ajuda externa:
“Para iniciar um trabalho, é fundamental buscar consultoria, trazer conhecimento de fora. Depois da equipe estruturada, pode-se prosseguir o treinamento com alguém de casa”.
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