A garantia de conforto, segurança e bem-estar para equipes de trabalho é parte essencial da gestão de uma fazenda. Mais que isso, é uma questão ética e legal, e o proprietário deve estar preparado
Toda fazenda, agrícola ou pecuária, é uma empresa, e como tal deve seguir à risca as leis trabalhistas. Faz parte desse compromisso garantir as condições adequadas de segurança, conforto e bem-estar para suas equipes, seja durante a realização das tarefas diárias, seja nos períodos de descanso. E aí faz toda a diferença o estado dos alojamentos disponibilizados para esses profissionais. O problema é que essa questão envolve tantas definições e tantos detalhamentos que podem fugir ao conhecimento ou à compreensão de boa parte dos proprietários e gestores, por mais atualizados que estejam sobre o tema.
Essa é uma parte essencial dentre os vários pontos do trabalho desenvolvido pela Produzindo Certo, contribuir para que a administração ofereça acomodações apropriadas aos trabalhadores e evite algum problema para as equipes, antes de qualquer coisa, e complicações para a fazenda. Segundo o especialista de Sustentabilidade da Produzindo Certo, Jelvis Santos Machado, há dois caminhos para que o produtor esteja alinhado com essa questão.
Um deles é conhecer as normas do Ministério do Trabalho, acessando o site, por exemplo, o que vai exigir tempo e dedicação. “Pode ser uma forma menos custosa de aprender as regras para preparar a estrutura”, diz Machado. A outra opção é contratar um profissional de saúde e segurança que vai fazer a orientação técnica adequada sobre o que precisa ser feito, qual é o plano de implementação e o custo, seguindo a legislação ao assunto, como as normas regulamentares NR 24 e a NR 31.
Para Machado, há inclusive pontos nessa relação trabalhista muito mais ligados a uma questão de ética, que nem deveriam depender de normativas para serem atendidos. “Quanto mais bem-estar você proporciona ao trabalhador, melhor é o resultado desse profissional. Isso se estende a qualquer segmento”, acrescenta. Dentro de um alojamento, é essencial que todos tenham cama disponível, roupa de cama limpa, armário individual para guardarem seus pertences, banheiros que atendam às necessidades, chuveiros suficientes para a quantidade de pessoas alojadas, entre outros pontos.
O que as equipes da Produzindo Certo fazem é visitar a propriedade e indicar tudo o que tem e o que não tem. A partir daí, é definido um plano de ação para que se faça as adequações necessárias, que serão avaliadas na visita seguinte, dentro de um ano. Enquanto isso, o fazendeiro pode antecipar o relato do que está sendo feito, por meio de contato direto ou pelo aplicativo EuProduzoCerto. “A ideia é que o produtor não precise esperar por um ano para atualizar seu diagnóstico, ele acaba fazendo sua autogestão”, comenta Machado.
Para o fazendeiro é muito importante poder contar com esse apoio profissional e tecnológico, pois é difícil ter em mente todos os detalhes das normas. Só a NR 31 tem 17 itens para tratar da Segurança e Saúde no Trabalho na Agricultura, Pecuária, Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura, além dos anexos (a NR 24 trata de Condições Sanitárias e de Conforto nos Locais de Trabalho).
O que os dormitórios dos alojamentos devem ter, segundo a NR 31
- a relação de, no mínimo, 3,00 m² (três metros quadrados) por cama simples ou 4,50 m² (quatro metros e cinquenta centímetros quadrados) por beliche, em ambos os casos incluídos a área de circulação e o armário, ou, alternativamente, camas separadas por, no mínimo, 1 m (um metro);
- camas em quantidade correspondente ao número de trabalhadores alojados no quarto, sendo vedado o uso de 3 (três) ou mais camas na mesma vertical, devendo haver espaçamentos vertical e horizontal que permitam ao trabalhador movimentação com segurança;
- camas com colchão certificado pelo Inmetro;
- camas superiores de beliches com proteção lateral e escada afixada na estrutura;
- armários com compartimentos individuais para guarda de objetos pessoais;
- portas e janelas capazes de oferecer vedação e segurança;
- iluminação e ventilação adequadas;
- recipientes para coleta de lixo;
- separação por sexo.
A legislação ainda leva em conta questões culturais. Segundo a NR 31, “as camas podem ser substituídas por redes, de acordo com o costume local, obedecendo-se o espaçamento mínimo de 1 m (um metro) entre as mesmas”.
Willian Campos, coordenador de Campo da Produzindo Certo, faz questão de entrar nos alojamentos quando visita as fazendas. “Verifico se há sinalização adequada, extintores, saneamento”, informa. Segundo ele, a receptividade tem sido muito positiva. “O proprietário entende que a gente entra em sua fazenda para ajudá-lo a evitar um passivo trabalhista ou ambiental”, acrescenta.
Em muitos casos, o sistema de comercialização do qual o produtor faz parte já o obriga a cumprir todas essas normas, sobretudo quando depende de certificações para integrá-lo. “Entre 60% e 70% das exigências das certificações correspondem à essa questão. Todos os fiscais se preocupam muito com isso”, explica Campos. Segundo ele, os produtores certificados estão mais comprometidos com esse tema. No entanto, é preciso seguir evoluindo, pois é preciso ampliar a atenção para outros fatores diretamente relacionados.
Atender às normativas quanto a alojamentos, sobretudo os dormitórios e área de higiene pessoal, é também garantir segurança durante a jornada de trabalho. Em qualquer profissão, colaborador sem descanso representa um risco, que pode ser maior dependendo de sua função. “É fato que a falta de condições ideais de moradia aumenta os riscos de acidente no trabalho”, alerta Campos, lembrando que a situação ainda pode ser potencializada. “Falta de descanso, sobrecarga de trabalho, alimentação ruim e fora de horário, tudo isso é perigoso.”