O exemplo pioneiro da Condessa

Reconhecida há várias gerações pela produção de arroz responsável, a família Condessa Azevedo quer ser a primeira com soja RTRS no RS

Por décadas a ligação da península que separava o oceano Atlântico e a Lagoa dos Patos e conectava essa região no litoral sul gaúcho a Porto Alegre foi conhecida como a Estrada do Inferno. Barro e poeira faziam parte do caminho dos viajantes ao longo de mais de 300 quilômetros da RSC-101 – e deixavam muita gente pelo caminho.

Muitos deles eram, no entanto, acolhidos por Breno Terra de Azevedo em sua fazenda em Mostardas. A fama hospitaleira tornou-se, assim, uma marca registrada do produtor de arroz e pecuarista. E até rendia negócios. “Um agricultor que ficasse alojado um ou dois dias na fazenda conversava com o meu avô e saía negócio”, conta Eduardo Spieker Azevedo, 25 anos, neto de Breno Azevedo.

A preocupação se estendeu ao cuidado com os funcionários, incluindo a preocupação com as adequações de alojamentos e refeitórios, que muitas vezes também serviam de abrigo para os viajantes com problemas na estrada.

“Com a distância de Porto Alegre e o acesso ruim, tinha que tornar a nossa fazenda um local onde os próprios funcionários quisessem se manter trabalhando. E o arroz precisava de mão de obra muito intensiva antigamente, era importante ter o funcionário do seu lado, que valorizasse trabalhar contigo e que eles tivessem te acompanhando durante toda a safra”, completa.

Esse cuidado ajudou a forjar as características que hoje fazem da Fazenda Condessa uma referência no Estado e mesmo no Brasil. A propriedade surgiu no início dos anos 60 como Granja da Canoa, negócio derivado do trabalho do bisavô de Eduardo e que segue por quatro gerações da família – hoje o avô Breno, o pai Geraldo e o próprio Eduardo dividem as responsabilidades na pecuária e no cultivo de arroz e soja, respectivamente.

No início deste ano eles aderiram à Plataforma Produzindo Certo, com o intuito de obter assistência técnica no processo de certificação RTRS para a soja. Quando finalizar o processo de auditoria, a propriedade deve se tornar a primeira com esse selo no Rio Grande do Sul. Essa é a principal certificação internacional que assegura a produção de soja de forma responsável e confirma a reputação do produtor, verificando rigorosos padrões sociais, ambientais e produtivos, incluindo zero desmatamento.

O pioneirismo está no DNA da família. “Fomos os primeiros a trabalhar em um projeto de arroz de baixo carbono”, afirma Geraldo Condessa Azevedo, pai de Eduardo e responsável pela produção do cereal. De fato, a fazenda já colhe resultados de uma gestão eficiente e atenta a boas práticas na produção do arroz. 

Há doze anos a família iniciou um processo que visava quantificar a sustentabilidade da empresa. Mais recentemente, a fazenda participou de um projeto que mensura o ciclo de vida de uma saca de arroz. “Fizemos então, a análise de vida com 50 mil indicadores que avaliaram um saco de arroz produzido na propriedade, comparando nossos resultados com a média do Rio Grande do Sul”, explicou o engenheiro agrônomo Felipe Matzenbacher, que representou Geraldo na live Vozes Responsáveis.

O estudo, feito em parceria pela BASF em 2015 para avaliação do desempenho das boas práticas da Fazenda Condessa com os serviços de gestão de gestão fornecido pela empresa (Clearfield), evidenciaram as conquistas no cultivo irrigado.

O trabalho demonstrou que o grupo obteve desempenho superior às médias do estado, como custo 15% menor e produtividade 6% maior na safra 2012/2013. Também comparado às médias estaduais na mesma época, a fazenda consumia 12% menos energia na irrigação e tinha um impacto em emissão de gases de efeito estufa 13% menor.

“Se todo o estado produzisse da mesma forma que nós, a economia de energia representaria o consumo de 330 mil casas abastecidas em Porto Alegre por ano”, afirmou. “Utilizamos 16% menos água bombeada para cada saca produzida, que seria suficiente para abastecer a cidade de Porto Alegre por dois anos. E emitimos 13,2% menos CO2 equivalente. Isso, em dimensão estadual, pouparia em torno de 11,5 milhões de árvores”, afirmou Felipe.

Soja responsável

Agora, o grupo Condessa espera poder exibir resultados semelhantes de ganhos com a soja. A plantação teve início em 2012, com 250 hectares – hoje está em 1.200 ha. Grande parte desse volume é para comercialização de sementes.

“Aplicamos o diagnóstico socioambiental, fizemos uma avaliação completa dos requisitos exigidos na certificação que inclui legislação trabalhista, bem-estar dos funcionários, dados sobre solo, vegetação nativa, análise de água, armazenamento de combustível e agroquímicos e outros pontos. Chamou a atenção as práticas já realizadas e o interesse e engajamento dos produtores e os resultados alcançados pela Fazenda Condessa, o que comprova que boas práticas agrícolas se refletem em produtividade”, afirma Jaime Dias, agroecólogo da equipe técnica da Produzindo Certo.

Os produtores usam a técnica pingue-pongue, com produção de soja em um ano e arroz no outro em uma mesma porção da fazenda. Áreas antes destinadas ao preparo de verão, que eram poupadas do cultivo de arroz como forma de prevenir o desenvolvimento de plantas daninhas, agora recebem soja no período. Esse formato de rotação gera ganhos para as duas culturas, com incremento de renda. O aumento de produtividade, segundo Eduardo, é de 20 sacas de arroz por safra e seis sacas adicionais de soja.

O jovem formado em administração de empresas espelha também o retrato da renovação no campo – uma geração com formação acadêmica não apenas técnica, mas em gestão. Ele agrega esse conhecimento e modernas metodologias de gestão.

“Meu avô se preocupa muito com a parte social. Meu pai sempre foi grande estudioso e entendeu que para agregar valor no produto ou conseguir uma forma de financiamento mais barato a gente deveria fazer algo diferente dos outros produtores. E fazer isso gerando valor para as pessoas que tivessem nas grandes capitais consumindo nossos produtos, inclusive porque as pesquisas apontam a grande preocupação dos próximos anos, de produção com sustentabilidade, com longevidade”, avalia Eduardo.

“O meu papel é mostrar a nossa realidade para o mercado e fazer com que todas as boas práticas sejam percebidas. Mostrar nossa produtividade acima da média da região. E estar preparado para as oportunidades”, completa.