Neste dia 15 de outubro, o mundo celebra o papel essencial das mulheres que atuam no campo. A data foi instituída pela ONU em 1995 com o objetivo de dar visibilidade àquelas que, por muitos anos, trabalharam longe dos holofotes, mas que hoje se destacam como protagonistas do setor.
No Norte do Brasil, um exemplo claro dessa liderança feminina é a produtora rural Cristina Malcher. O agronegócio está no seu DNA desde a infância. Nascida no Espírito Santo, ela cresceu acompanhando o trabalho dos pais na pecuária e na cafeicultura.
“O agro sempre fez parte da minha vida, pois é uma atividade tradicional em minha família, que a exerce há quase dois séculos”, contou ela em entrevista ao Portal.
A relação com a terra, no entanto, deu um salto em 1970, quando a família decidiu investir em novas fronteiras: a Amazônia.
Na época, a mudança para o Pará foi motivada pela campanha do governo federal que promovia a ocupação de terras na região, um cenário que a jovem Cristina, ainda menina, abraçou com entusiasmo. “No momento em que aqui cheguei, com meus olhos de menina, me apaixonei pela exuberância desse Estado”, lembra.
A chegada ao Pará marcou o início de um longo caminho de dedicação ao campo e ao desenvolvimento rural. “Meu pai viu a oportunidade e o momento para investir em áreas mais extensas do que aquelas que possuíamos no Espírito Santo”.
Com raízes familiares profundas na pecuária, Cristina ajudou a consolidar a propriedade da família, que hoje se destaca na criação de gado das raças Guzerá e Nelore, além de desenvolver projetos em silvicultura.
Uma trajetória de liderança no campo
Mas não foram apenas as atividades na fazenda que moldaram sua carreira. Cristina Malcher foi além do papel de produtora rural e abraçou a missão de ser uma liderança no agro. Atualmente, é diretora da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Pará (Faepa) e presidente da Comissão das Mulheres do Agro no estado.
Essas funções, somadas à sua experiência como advogada e até como prefeita, demonstram o compromisso dela em ampliar a representatividade feminina e fomentar o agro responsável na Amazônia.
“Sou da opinião de que todos nós devemos assumir compromissos no sentido de deixarmos um mundo melhor do que aquele que recebemos e, portanto, devemos contribuir e participar dessa construção”.
E produzir na Amazônia, como sabemos, apresenta desafios únicos. Segundo Cristina, a ausência de regularização fundiária, que gera a falta de titulação da terra, ainda é um dos maiores obstáculos para os produtores da região. O problema afeta não só a gestão das propriedades, mas também limita o acesso a políticas públicas e investimentos.
O protagonismo feminino no agro
Na visão de Cristina, o protagonismo feminino no campo é uma realidade em crescimento. Nos últimos anos, ela viu um número crescente de mulheres assumirem a gestão de suas propriedades e liderarem grandes transformações. Ainda que o percentual seja pequeno em comparação aos homens, o impacto das mulheres no agro é cada vez mais significativo.
“Atualmente, as mulheres têm participado ativamente na gestão das propriedades rurais, ainda que em percentual pequeno, mas expressivo se comparado com o passado recente”, destaca.
Para ela, esse avanço reflete um movimento de mudança que deve se acelerar nos próximos anos. “Com o uso de tecnologias e um olhar mais sensível e comprometido com um negócio mais sustentável, além da incessante busca por conhecimento, as mulheres terão cada vez mais protagonismo e reconhecimento de sua contribuição para um agro ainda mais forte”.
Apesar de avanços significativos, Cristina reconhece que ainda há um longo caminho para se alcançar a equidade de gênero no setor. Ela acredita que as oportunidades devem ser iguais para homens e mulheres, e o verdadeiro desafio é assegurar que todos possam competir em pé de igualdade. “O nivelamento deve ser efetuado pelo comprometimento e capacidade, e não pelo sexo”.
A missão da Comissão das Mulheres do Agro do Pará é justamente essa: criar um ambiente onde as produtoras possam se capacitar, compartilhar experiências e alcançar o reconhecimento merecido. Com um olhar inclusivo e detalhista, Cristina acredita que as mulheres têm um papel fundamental para fortalecer o agro e torná-lo mais resiliente.
A sustentabilidade em foco
Cristina destaca que as mulheres, por natureza, possuem um compromisso intrínseco com a qualidade de vida e o cuidado com o meio ambiente. Essa característica torna a contribuição feminina indispensável para práticas agrícolas mais sustentáveis.
Na propriedade dela, em Rondon do Pará, a cerca de 500 km da capital Belém, a gestão sustentável é regra, e o bem-estar animal, prioridade. As áreas de preservação florestal (reserva legal), de preservação permanente (APPs) e das nascentes de água são rigorosamente mantidas.
Tecnologias de precisão, como drones, são empregadas para monitorar as atividades, além da valorização de práticas que garantam o bem-estar animal.
A mensagem de uma líder
Neste Dia Internacional da Mulher Rural, Cristina Malcher deixa uma mensagem de otimismo e força para todas as mulheres do campo.
Para ela, o futuro do agro depende de pessoas comprometidas com a sustentabilidade, a inovação e, acima de tudo, com a construção de um setor mais justo e equilibrado.
“Conhecimento, resiliência e perseverança. Acredito que esse tripé nos colocará no lugar que desejamos alcançar”.