A melhor aposta para lidar com o fogo nas propriedades rurais é agir antes que ele aconteça. Com prevenção estratégica e profissional, a relação entre investimento e resultado é de um para dez
Neste ano, as condições climáticas intensificaram o estado de atenção com o perigo de incêndio em propriedades rurais do Brasil todo. No Cerrado, ainda mais, por já ser um bioma bem seco. A preocupação foi redobrada com a chegada do fenômeno climático El Niño, que ampliou o risco de queimadas e, consequentemente, de os prejuízos econômicos, sociais e ambientais ganharem grandes proporções. Investir em prevenção, sobretudo de forma estratégica e profissional, é uma boa maneira de aumentar a segurança nas fazendas e se precaver dessa situação.
No entanto, para implantar um plano eficiente de prevenção é necessário que agricultores e pecuaristas ampliem e aprimorem a visão sobre o cuidado com o fogo. De maneira geral, esse olhar tende a ficar limitado ao combate, direcionado quase que exclusivamente a conter e eliminar as queimadas quando já estão ocorrendo, e não se antecipando ao problema.
Embora essa questão seja tratada corretamente em diversas propriedades, tal postura ainda precisa ganhar escala. Estímulos para isso não faltam, inclusive financeiros. Segundo a Associação dos Produtores de Soja e Milho (Aprosoja), no ano seguinte a um incêndio, uma fazenda pode perder em produtividade dez sacas por hectare na soja e até cinco sacas por hectare no milho.
A recuperação da fertilidade do solo pode demorar de 3 a 5 anos. O valor das perdas em benfeitorias passa de R$ 4,2 mil por hectare e o custo para reposição de maquinário consumido pelo fogo varia entre R$ 500 mil e R$ 1,5 milhão.
No caso de pastagens, cada hectare destruído pelo fogo vai demandar investimento de R$ 4 mil a 5 mil para restauração, conforme a Associação dos Criadores do Mato Grosso (Acrimat). Em infraestrutura, a reconstrução de cercas pode ter um custo de R$ 10 mil por quilômetro de extensão; a de um curral, no mínimo R$ 300 mil; e a reposição de maquinário, entre R$ 300 mil e R$ 400 mil.
Isafas Balke, líder da Brigada Aliança na unidade de Pedra Preta (MT), apresenta a equação que garante um respiro, ou melhor, representa a segurança diante de números tão alarmantes. “Cada R$ 1 investido em prevenção contra incêndios gera uma economia de R$ 10 em combate”, afirma o especialista. “Além disso, evita os prejuízos de ordem econômica, social e ambiental.”
Prevenção coletiva
A Brigada Aliança faz parte da organização não governamental (ONG) Aliança da Terra, instituição irmã da Produzindo Certo, e é formada por brigadistas experientes e altamente capacitados. Também por um time técnico-científico multidisciplinar responsável por captar e processar informações de diversas fontes, inclusive dos próprios brigadistas, para definir as melhores estratégias de prevenção e combate ao fogo.
As equipes da Brigada Aliança atuam tanto em unidades de preservação, sob cuidados do poder público, quanto em propriedades privadas. A unidade de Pedra Preta, por exemplo, antes patrocinada pela JBS, é mantida por um pool de produtores de gado de corte que entenderam a importância das atividade dos brigadistas durante o ano todo. Além de reduzirem os riscos de incêndio, tornam menos complexo o combate ao fogo. Sobretudo entre os meses de agosto e outubro, período de maior incidência das queimadas.
Marco Túlio Duarte Soares, proprietário do Grupo Celeiro, está nesse grupo de pecuaristas. “Estive em duas áreas onde a Brigada Aliança atuava e pude ver que, além de capacitados, são muito dedicados a resolver os problemas”, afirma o empresário. “Por outro lado, vemos produtores despreparados para o combate e o controle do fogo, sem equipamentos e até com falta de conhecimento técnico.”
O objetivo é que essa parceria seja um projeto com longevidade, de acordo com Renato Moreira de Oliveira, presidente do Sindicato Rural de Pedra Preta. Segundo o dirigente, a presença da Brigada Aliança reduziu em mais de 90% as ocorrências de queimada na região. “No ano passado, praticamente não tivemos focos de incêndio”, afirma o dirigente, acrescentando que há mais de mil pequenas propriedades e mais de 100 assentamentos da reforma agrária na região.
O valor do diagnóstico
Quando se fala em prevenção, o diagnóstico é a etapa inicial. Trata-se do processo de identificação das condições da região que se pretende proteger e do que pode representar perigo ali. Há uma série de informações que vão direcionar o trabalho da brigada de incêndio. “Um passo básico que orienta a prevenção nas fazendas que visitamos é a análise da localização”, diz Balke. “Avaliamos, por exemplo, se há rodovias ao redor, pois podem oferecer riscos.”
Com base no trabalho desenvolvido pela Brigada Aliança, o diagnóstico das propriedades também visa a encontrar fatores de vulnerabilidade, com os quais é necessário ter mais atenção. Pode ser a rede de energia elétrica, pontos mais comuns de ignição do fogo nos últimos dez anos ou uma área vizinha com recorrência de fogo.
“Fazemos o levantamento dos focos de calor dentro da propriedade nos últimos dez anos para tentar descobrir o local, as causas, os períodos de ocorrência, as classes de material combustível e as áreas prioritárias”, explica Balke. O líder de brigada ressalta que foco de calor é diferente de incêndio, por isso é fundamental identificar se esse foco pode ser uma queima de leira, um fogo local ou uma queima controlada.
Em fazendas de pecuária, o mesmo pasto que nutre os animais também é material combustível que alimenta o fogo. Principalmente nos períodos de seca, com formação de palhada. “Por isso deve ser mantido baixo e, mais no interior da propriedade, precisa ser vedado”, comenta Balke. “Orientamos os produtores sobre como manejar corretamente a palhada e fazer os aceiros.” Os aceiros são linhas capinadas no campo para retirada da vegetação e interromper o avanço do fogo.
Informações essenciais para prevenção
Para evitar novas ocorrências de incêndio, é importante conhecer o histórico do fogo na propriedade e em seu entorno. E entender que fatores favorecem os riscos. Estes são alguns pontos relevantes para fazer tal conexão.
- Local onde já ocorrem os incêndios
- Causas desses incêndios
- Período de maior ocorrência de focos
- Frequência de focos
- Variação do número de ocorrências
- Classes de materiais combustíveis
- Áreas prioritárias
- Diversidade climática
- Níveis de atividade
Pilares do enfrentamento
O trabalho de prevenção e combate a incêndios é uma ação cíclica, que deve ser sempre renovado com as informações de cada operação. Essa retroalimentação contribui para que os próximos passos sejam mais seguros e certeiros. A Aliança da Terra desenvolveu uma descrição dos cinco Pilares de Enfrentamento aos Incêndios para explicar melhor como é esse ciclo. Acompanhe.
Planejamento – Consiste na preparação para as atividades que serão realizadas ao longo do ano. Como os pilares de enfrentamento aos incêndios são retroalimentados, o planejamento é munido de informações — focos de calor, mapas de reincidência, dados de campo, números de combates e tempo gasto — que subsidiam a tomada de decisão.
Prevenção – As ações de prevenção desenvolvidas pela Brigada Aliança são parte vital do “combate ao fogo”, devido à utilização de uma abordagem construtivista na participação coletiva do processo de organização, desenvolvimento e implementação, aliando saber popular, organização social e conhecimento técnico-científico.
Detecção precoce – Esta é uma fase primordial, uma vez que nenhum incêndio começa grande. Hoje, a Brigada Aliança conta com sistemas de alertas oriundos de diversos sistemas, com a utilização de satélites, torres de monitoramento e monitoramento de campo.
Resposta rápida e qualificada – Tão importante quanto identificar princípios de incêndios é combatê-los de forma rápida e qualificada. A Brigada Aliança responde rapidamente aos acionamentos, com agilidade no deslocamento e no combate. Para manter essa prontidão, conta com equipes treinadas, altamente capacitadas, que recebem qualificações continuadas e são munidas de equipamentos de ponta.
Análises e resultados – A Brigada Aliança atua de forma contínua, com ações de prevenção, combate e coleta de informações de campo. Devido a essa característica, a equipe Aliança realiza, frequentemente, análise dos dados levantados e como os resultados podem auxiliar nas atividades desenvolvidas.