Produtores de soja de Mato Grosso participam de estudo inédito para mensuração e precificação de serviços ambientais
Ser remunerado pelos serviços ambientais prestados dentro da propriedade. Esse é o objetivo da maioria dos produtores rurais que aplicam boas práticas e contribuem para uma produção agropecuária sustentável no Brasil.
“O pagamento por serviços ambientais está previsto no Código Florestal, mas o produtor ainda não recebe por isso”, afirma Charton Locks, COO da Produzindo Certo.
Para produtores do município de Campos de Júlio, em Mato Grosso, essa realidade começou a mudar no final do mês de março passado, quando eles receberam os primeiros valores referentes aos serviços ambientais prestados em suas propriedades.
Eles fizeram parte de um projeto que reuniu um grupo de empresas e organizações do Brasil e do exterior para testar metodologias e tecnologias inéditas no campo.
Financiado pela Aliança pela Floresta Tropical (TFA, na sua sigla em inglês), plataforma do Fórum Econômico Mundial, e com a parceria do PSA (Programa de Serviços Ambientais) Soja Brasil, o trabalho contou ainda com a participação de duas empresas brasileiras que desenvolvem soluções de precisão: A Sumitomo Chemical, a Solinftec, agtech especializada em automatização de processos agrícolas, e a fabricante de máquinas Jacto.
A Solinftec instalou softwares nas máquinas agrícolas para calcular as emissões. Já a Jacto disponibilizou o espectrômetro, um sensor desenvolvido para a medição eletrônica do estoque de carbono no solo.
“A partir dessa mensuração, a gente identifica a quantidade de carbono fixa no solo e aí sim se constrói um algoritmo. Essa metodologia de precificação está aliada às práticas agrícolas que o agricultor utiliza em função do acúmulo de carbono no solo. A precificação é dada então a partir do momento em que a gente utiliza o algoritmo para entender as correlações de matéria orgânica no solo com as práticas adotadas pelo produtor”, explica Marco Fujihara, diretor da EcoFix, parceira do projeto e responsável pela aplicação da metodologia do estudo.
Além da fixação de carbono no solo, também foram mensurados serviços adicionais gerados pelos produtores, como a manutenção da biodiversidade e vegetação acima do mínimo exigido pela legislação e a disponibilidade de água nas propriedades. “Hoje só o carbono tem valor de mercado, mas esses outros elementos também são muito importantes”, reforça o COO da Produzindo Certo.
Cheque na mão
As cinco propriedades analisadas produzem soja no cerrado e fazem parte da Plataforma Produzindo Certo, que foi contratada para fazer a seleção, a articulação com os produtores e o levantamento de dados iniciais das áreas.
“Parte da quantificação foi feita pelo nosso próprio diagnóstico. Essa é uma das vantagens da plataforma, ela coloca as propriedades um passo à frente”, destaca Charton Locks.
A Sumitomo Chemical, uma das principais empresas químicas do mundo, remunerou os produtores que participaram do estudo pelos créditos gerados e comprovados. A entrega dos cheques ocorreu em março.
Além do reconhecimento financeiro pelos serviços ambientais prestados, os produtores que participaram do estudo têm direito a um relatório do talhão da propriedade fornecido por uma plataforma digital e a um certificado de participação.
Os resultados do projeto ainda não foram publicados, mas um aspecto interessante, segundo Charton Locks, é que foi identificado mais carbono no solo na área de lavoura que nas áreas de vegetação nativa.
O estudo tem ainda metas ambiciosas, como mostrar que é possível aplicar novas metodologias capazes de baratear os custos da medição de carbono no solo, gerar recomendações para subsidiar a formulação de políticas públicas para o pagamento por serviços associados à produção sustentável no Brasil e também criar um modelo econômico viável para estimular proprietários rurais a adotarem as melhores práticas agrícolas.
“Apenas cumprimos as regras”
Uma das propriedades contempladas pelo projeto foi a Fazenda Lajeada, que, além do cultivo de soja, produz também milho e feijão e acaba de iniciar na pecuária de corte. “É um projeto ainda inicial. Não temos grandes avanços ainda na parte financeira. Mas a chance de dar certo é grande”, disse o proprietário da fazenda e produtor rural Leandro Bortoluzzi.
Áreas de reserva acima do exigido pela Lei, o uso do plantio direto e o manejo adequado do solo são alguns dos exemplos de boas práticas adotadas na fazenda. “Não realizamos serviços ambientais. Apenas cumprimos todas as regras ambientais, sociais e trabalhistas”, declara Bortoluzzi.
“É importante se desenvolver o mercado de créditos de carbono, fomentar financiamentos para os produtores e diminuir a vontade de um produtor de desmatar, sendo que ele será remunerado por deixar sua mata intacta. Importante também para mostrar que a agricultura atual gera muito crédito de carbono, até mais que alguns biomas, como o cerrado”, defende ele.
Ao ser perguntado sobre a relevância de um estudo como este, dedicado a medir e precificar os serviços ambientais prestados pelos produtores, Bortoluzzi não tem dúvidas. “É muito importante e já deveria estar acontecendo há muito tempo. Uma vez que não somos vilões, mas na verdade somos os produtores que mais preservam no mundo”.
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