A chave para destravar o seguro rural - Produzindo Certo
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A chave para destravar o seguro rural

A contratação de seguro rural no Brasil ainda enfrenta desafios significativos, principalmente quando comparada a outras nações. Dados do Ministério da Agricultura mostram que apenas cerca de 20% da área agrícola brasileira está coberta por algum tipo de seguro, em contraste com os mais de 90% nos Estados Unidos, por exemplo.

Esse baixo índice de adesão ocorre apesar dos riscos que os produtores rurais enfrentam, como possíveis variações climáticas extremas, além de pragas e doenças.

“O Brasil sempre foi um país privilegiado em questões climáticas, não temos problemas com tornados, terremotos, ou tsunamis, por exemplo. Acho que por isso a cultura do seguro não é tão disseminada por aqui”, disse o CFO da Produzindo Certo, Thiago Brasil.

“Além disso, é natural a dificuldade humana em pensar em termos de probabilidade, ainda mais quando as probabilidades são tão pequenas, mas isso não quer dizer que não existam riscos. Quando se trabalha alavancado é importante se proteger dos piores cenários, o produtor precisa continuar no jogo”, explicou ele.

Uma abordagem promissora para ampliar a adesão ao seguro rural no país pode ser a introdução de premiações para produtores que adotam práticas agrícolas sustentáveis.

Esses produtores, que investem em técnicas de conservação de solo, uso eficiente de recursos hídricos, manejo integrado de pragas, entre outras práticas, não apenas contribuem para a preservação ambiental, mas também representam um risco financeiro menor para as seguradoras.

Estudos apontam que fazendas que seguem práticas sustentáveis têm maior resiliência a eventos climáticos adversos e, portanto, menor probabilidade de acionar seguros.

Essas práticas reduzem a degradação do solo, melhoram a retenção de água e promovem a biodiversidade, o que resulta em colheitas mais estáveis e produtivas.

Como consequência, produtores sustentáveis podem ter acesso a prêmios de seguro mais baixos ou receber incentivos financeiros diretos, como descontos nas apólices.

O exemplo na cafeicultura  

Um exemplo prático nessa direção foi o anúncio, em julho deste ano, de um acordo inédito entre o Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), o Conselho Nacional do Café (CNC) e a multinacional Pró Natura Internacional, que envolve o projeto “Cafeicultura Brasileira Sustentável – Sistema de Compensação de Crédito de Carbono na Apólice de Seguro Rural no Brasil”.

A iniciativa vai utilizar créditos de carbono para beneficiar financeiramente os produtores que adotarem práticas sustentáveis. Isso significa que os cafeicultores brasileiros terão uma proteção financeira adicional contra os riscos agrícolas.

No documento assinado, o acordo visa implantar e desenvolver a viabilidade dos ativos obtidos pelo crédito de carbono, proporcionando a redução de custos para o produtor no pré-custeio da safra. Além disso, o desempenho dos produtores em relação à pegada de carbono será continuamente avaliado.

“Esse é um projeto inédito, e que tem vários focos. Ele trabalha a questão da sustentabilidade, os riscos e as mudanças climáticas, alinhados com o seguro rural”, destacou o secretário de Política Agrícola do Mapa, Guilherme Campos.

Ainda de acordo com o Ministério, o objetivo do acordo é a redução do custo da apólice do seguro rural por meio da compensação financeira da venda dos créditos de carbono.

Com isso, o trabalho é feito por meio de uma política de seguro favorável ao produtor rural, em consonância com as boas práticas agronômicas e o enfrentamento às mudanças climáticas.

“Essa iniciativa é muito saudável para o setor, pois você cria o alinhamento certo de interesses, e consegue precificar os produtos — e o risco — de maneira mais eficiente. Também é mais justo com o produtor, pois o risco diminui para a seguradora”, reforçou Brasil.

Com a assinatura do documento, iniciam-se agora os estudos para definição dos percentuais a serem abatidos sobre a apólice do seguro e o modelo desse benefício, bem como a escolha da cooperativa que irá compor o trabalho.

“O carbono acaba sendo a métrica mais famosa para ativos ambientais, mas desenvolver um projeto de carbono não é simples, e pode ter um custo elevado, o que pode dificultar a efetividade desta medida”, destacou o CFO.

“Outras métricas ambientais, portanto, poderiam ser incluídas e levadas em consideração para gatilhar a redução do custo da apólice. Acredito que podemos evoluir para isso também”, completou.

Ciclo virtuoso

A adoção de um sistema de premiação baseado em sustentabilidade não só estimula práticas agrícolas responsáveis, mas também fortalece a estabilidade financeira das operações agrícolas, criando um ciclo virtuoso que beneficia todo o setor.

“Medidas como essa, associadas aos descontos previstos no RenovAgro — com até 1% de desconto no custeio — aumentam a competitividade do agronegócio brasileiro como um todo”, declarou Brasil.

Para ele, sem esse reconhecimento, a adoção de melhores práticas representa um custo adicional, o que equivocadamente retira a competitividade do produtor.

“Ao reconhecer essas práticas nos custos dos empréstimos e seguros, portanto, corrigimos uma distorção importante que existe nos custos de produção”, concluiu.

Para que propostas como estas se tornem mais comuns, é necessária uma regulamentação que incentive seguradoras a criarem produtos diferenciados para agricultores que comprovadamente seguem práticas sustentáveis.

Além disso, campanhas de conscientização sobre os benefícios do seguro rural e a importância da sustentabilidade podem ajudar a mudar a mentalidade dos produtores, aumentando a adesão a esse tipo de proteção.

Em resumo, a inclusão de premiações por práticas sustentáveis pode ser a chave para o crescimento do seguro rural no Brasil, beneficiando tanto os produtores quanto as instituições financeiras, e promovendo uma agricultura mais sustentável e resiliente.